quinta-feira, novembro 09, 2006

O que se aprende no estágio...


Caros leitores, estou estupefacta!

Chamem-me ingénua, chamem-me o superlativo de honesta, chamem-me tudo o que quiserem! Mas digo-vos que mesmo tendo passado por esta pequeníssima aventura e por mais que tente compreender o porquê desta situação, continuo sem conseguir perceber a necessidade de criar situações destas...

Então o que me aconteceu, e que seguramente acontece por este país fora, em todas as suas farmácia, vezes e vezes sem conta, foi algo inédito para mim (como já deu para perceber!) mas que só me pode ajudar a perceber para o que ser o estágio em farmácia comunitária. A situação é simples, uma senhora idosa (com todo o chico-espertismo ao rubro!) dirigiu-se à minha farmácia para aviar uma receita que o médico lhe passou uns dias antes. Eu verifiquei aquilo que normalmente se verifica logo: se tinha o número de beneficiário correcto, se a cor da vinheta correspondia ao que era suposto ser, se havia vinheta do médico, se a receita está assinada pelo médico, se está dentro do prazo... enfim, uma série de coisas. Mal sabia eu que a senhora, de um dos dois medicamentos que vinham receitados, tinha artisticamente transformado o 1 em 2, assim como a palavra uma em duas! Ou seja, tinha rasurado aquilo que o médico tinha escrito! E isto, em relação a um medicamento (Ben-u-ron (r)) que custa cerca de dois euros (PVP) e que depois de comparticipado fica com um custo para o utente de 0,62 euros!!!!!

Claro que eu não reparei nisto, até porque estava (e volto a salientar) artisticamente bem rasurado: a cor da tinta era igualzinha, o 1 estava meio torto originalmente, o que lhe facilitou na transformação para 2 e a palavra um do sr doutor estava uma espécie de rabisco iniciado com um "u"...
A minha colega farmacêutica que estava a fazer a conferência das receitas é que me chamou a atenção e explicou-me: 1) a gravidade da situação pois a receita poderá vir devolvida pelo Infarmed; 2) face a uma situação similar, como é que deverá ser a minha atitude. Mas rematou com uma bela frase:"É para isto que serve o estágio: para a Andrea se aperceber da quantidade de coisas para as quais tem de ter atenção!"

A mim resta-me divagar o porquê destas falcatruazinhas que parecem ao utente uma coisa sem importância mas que pode dar algumas dores-de-cabeça às farmácias e aos farmacêuticos. Resta-me também ficar um pouco desiludida com a minha honestidade e por acreditar que toda a gente é como eu, por eu nunca pensar em fazer este tipo de coisa!

You live, and you learn! Acho que não há frase mais adequada aqui.

Claro que os meus colegas minimizaram logo o meu erro e deram-me conta das vezes que isto aconteceu, dando vários exemplos com diferentes coisas: preenchimento da receita com outros medicamentos, utentes que põem as portarias para terem maior desconto - só porque o médico se esqueceu..., entre muitos outros casos mirabolantes. Basicamente o que me aconteceu, até por ser com um "mero" Ben-u-ron (r), é considerado o arroz doce das aldrabices dos utentes!

3 comentários:

riacrdoo disse...

Excelente post, cara Andie!
Às vezes é necessário estar mesmo atento a estas pequenas coisas do dia a dia para entrar bem na profissão. De certeza que nunca vão ensinar semelhante coisa numa aula na faculdade.
É realmente curioso, o que as pessoas fazem em relação à sua saúde!

Anónimo disse...

Ola. Realmente o estágio é muito importante para nós estudantes de ciências farmacêuticas, que saimos da faculdade com as nossas ideias arrumadinhas e com a ilusão de que o mundo cá fora é um mar de rosas. Este período tem o condão de nos fazer despertar para a realidade..que não é, como se verifica, muito aliciante. Também na minha farmácia já assisti a um caso de um senhor que "prescreve" a seu belo prazer nas receitas que leva a farmácia. E o pior de tudo é que mesmo sendo desmascarado uma vez voltou a tenta a sua sorte mais 2 ou 3 vezes.
O que me impressiona mais, é o facto de serem pessoas com o ar mais pacato do mundo. Aproveito também para deixar aqui outro caso de tentativa de burla e que surtiu efeito com uma colega minha. Um senhor vai à farmácia e faz uma compra pequena, pagando com uma nota de 50€. Quando o troco está feito ele diz que tem a quantia certa para ajudar no troco. E a pessoa que não esteja atenta devolve a nota do senhor e ainda o troco, que até pode já ter dado. No contacto com o público é preciso todo o cuidado. E do que ja aprendi nestes quase 2 meses, o cliente nem sempre tem razão!

Andie disse...

obrigado Rafael pelo teu comment! ;-) sempre bem vindo!!

Acerca do assunto, ainda hoje assisti a uma receita rasurada pelo utente, transformando outra vez um "um" num "dois". Inteligentemente, a drª que o atendeu deu so uma caixinha e o utente nem reclamou a 2ª caixa. ;-) espertos.
Mas esse teu testemunho só vem frisar ainda mais a existência do chico-espertismo português! Enfim, todo o cuidado é pouco.