quinta-feira, setembro 21, 2006

Aquilo que ninguém faz, mas que toda a gente faz, e que toda a gente sabe, mas que ninguém sabe!

Hoje vem um tema tabu nesta querida profissão: a dispensa de medicamentos sujeitos a receita médica (MSRM) por farmacêuticos.
Parece que aquilo que os nossos professores disseram ao longo dos cinco anos rapidamente desaparece no ar: basta umas quantas horas num curso de farmácia prática para que toda a gente aprenda que anti-histamínicos e corticosteróides são dispensados na farmácia sem pudor. Ou seja, nós inexperientes estagiários que ainda nem sequer chegámos aos balcões das farmácias, estamos já a aprender que aquilo que nos ensinaram não é bem assim.
Mas então o que falha aqui? Será que são os farmacêuticos que têm um ímpeto irresistível para ser médicos, ou antes é uma sociedade que não quer reconhecer aos farmacêuticos as suas capacidades?
É que a própria sociedade é um pouco hipócrita ao criticar este acto, pois toda a gente gosta de ir à farmácia para comprar um MSRM sem ter de ir ao médico.
Durante várias destas sessões no curso fala-se abertamente de dispensar MSRM em situações minor, visto que o farmacêutico não tem a capacidade de fazer diagnóstico de patologias mais graves.
Tudo isto gera também situações algo caricatas: fármacos com apresentações não sujeitas a receita médica mais caros que os respectivos genéricos (que são sujeitos a receita médica), ou fármacos que são bastante mais perigosos em MNSRM do que congéneros mais seguros que são MSRM (em particular, a presença de anti-histamínicos H1 de 1ª geração nas especialidades para gripe, contra as formulações mais seguras de anti-histamínicos de 3ª geração sujeitas a receita médica).
O principal benefício que a dispensa de MSRM por farmacêuticos traz é sem dúvida a escapatória às consultas do SNS, que como toda a gente sabe podem demorar alguns dias a serem marcadas, enquanto que a situação patológica mantém-se a incomodar a pessoa, senão mesmo a piorar.
Faço um pouco de mea culpa: será que os farmacêuticos têm realmente a capacidade de identificar as situações menos graves, e de as tratar com MSRM? É que também não parece ser uma boa ideia transformar a farmácia num consultório improvisado!
Pois é, alguns jovens estagiários ficam sempre um pouco confusos com estas situações com que se deparam. Espero que seja só um problema de tempo e que no estágio corra tudo bem!
(título by Li)

2 comentários:

Andie disse...

pois, realmente a culpa é do SNS. As consultas são demoradas, uma consulta num consultório privado ou da especialidade são caras. Assim os utentes/doentes escapam-se para a farmácia para tentar sacar aquilo que acham que merecem para tratar a sua doença. Mas esquecem-se da função do médico. Acho que quem deveria estar mais preocupado com este assunto seria a Ordem dos Médicos (os médicos em geral). Mas enquanto a lei não impera, e todos dormem na forma, hão-de haver sempre uns farmacêuticos espertos a dispensar MSRM.
Este assunto faz-me lembrar a polémica das parafarmácias. Todos criticavam a dizer que ia perder-se todo o aconselhamento farmacêutico (para não falar dos cuidados farmacêuticos). Mas esquecem-se que para dispensar MSRM alguns profissionais estão lá, o que se revela uma enormíssima hipocrisia (tal como disseste no post).

Anónimo disse...

Antes de mais queria felicitar-vos pela coragem de apontar virtudes e desgraças do mundo farmacêutico. De facto este curso de farmácia prática deixou-me um pouco confusa sobre o que fazer em determinadas situações, estando ao balcão, com uma pessoa à frente e pouco tempo para reagir. Penso que, em muitos casos, teremos que seguir a política da farmácia (embora nem sempre concordemos com ela…). Apesar de tudo, foi útil para reencontrar amigos depois das férias e dizer um sentido “até sempre” à faculdade de farmácia.